O que é real?

Matheus Ribeiro

Matheus Ribeiro

“Realidade” não é um mundo exterior, separado de quem o vive. Pelo contrário, a realidade se trata sempre de contato: uma figura de interesse energizada por um fundo de vivência. Conhecemos o mundo através de seu toque: os afetos que vivemos espontaneamente.

A realidade “neutra” de objetos isolados usada pela ciência moderna é o produto de um conhecimento obtido a partir de um estado inibido, neurótico. Se o mundo das ciências objetivas é construído neuroticamente, é claro que os sujeitos que não se ajustam neuroticamente em sua vivência apareceriam como distantes desse mundo, como é o caso dos sujeitos que produzem ajustamentos psicóticos.

Mesmo os sujeitos capazes de fluir espontâneamente no mundo através de seus ajustamentos criadores são mal-vistos por esse mundo neurótico. Laura Perls, em seu artigo “Entendidos e Mal-Entendidos em Gestalt-Terapia”, diz:

“A personalidade integrada nesse sentido tem estilo, uma forma unificada de expressão e comunicação. Ele ou ela podem não se conformar ao que é considerado como bem ajustado/a, socialmente útil e desejável ou mesmo sadio. Ele será chamado de excêntrico ou irresponsável, estranho, louco, ou criminoso, ele pode ser anarquista, um pintor ou poeta, homossexual ou vagabundo.”

Esse é um dos sentidos em que a Gestalt-Terapia faz uma crítica social a nossa sociedade altamente burocrática, tediosa, disciplinar e desvitalizante: nosso próprio conceito de realidade é neurótico – nossa própria ciência é neurótica – e logo, nossa própria organização social é neurótica e nossa educação produz neuróticos. E o ciclo se inicia novamente…

Num movimento contrário, a Gestalt-Terapia é uma tentativa de resistência contra esse modelo mortificador e tedioso. Os profissionais que usam-a como fundamento de sua prática – seja no consultório, na rua, na escola, na comunidade, nas organizações – advogam por uma maior integração da experiência afetiva e interessada, o que, em nosso sistema que frequentemente desconsidera o âmbito emocional e o desejo, resultará em necessário enfrentamento e conflito.

Ajustar-se criativamente significa desajustar-se aos ideais sociais normativos. É se recusar a aceitar uma realidade pronta – é inventar a própria realidade.

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