Só há vencedores

Matheus Ribeiro

Matheus Ribeiro

Retornando para um jogo online que eu frequentava durante minha adolescência, percebi que haviam acrescentado, durante minha ausência, a possibilidade de resetar os seus pontos competitivos a qualquer momento. Há muitos anos, quando eu jogava pela primeira vez, a tabela de pontuação sempre era um reflexo do real: haviam os vitoriosos, os medianos e os derrotados, como em qualquer jogo.

Ao retomar a jogatina, percebi que atualmente, a tabela conta apenas com vencedores. Quem olha para a tabela, não entende. Como podem haver só jogadores vitoriosos em um jogo onde uns enfrentam os outros? O que acontece? Percebi então que logo que qualquer jogador nota que está com uma pontuação mediana ou ruim, ele automaticamente reinicia seus pontos. A tabela acaba por demonstrar apenas jogadores que estão indo muito bem.

E o que isso tem a ver com terapia ou psicologia? Bem, acho muito interessante que nesse microcampo que é um jogo online, uma coisa tão comum em nossa sociedade fique explícita: a exigência de sucesso, desempenho e vitória para a imagem.

Hoje, a derrota se torna algo vergonhoso. É necessário demonstrar que está tudo bem, que se está vencendo e feliz. É uma tendência que também assola as redes sociais: estas são onde nos expomos, mostrando estritamente nossos momentos de prazer, alegria, vitória.

Logo percebemos que a imagem que criamos é fundamentalmente distante de nossa vida de fato, envolta em todas suas singularidades, sofrimentos, vínculos, desejos, dores, afetos e angústias.

Hoje, só há lugar para a positividade. E é isso que tem acabado conosco e destruído qualquer possibilidade de movimento político coletivo. É o que denuncia o autor Byung-Chul Han em seu livro “Sociedade do Cansaço”. O nome que ele dá a essa tendência é “violência da positividade”.

Na sociedade da positividade, exclui-se tudo que é negativo, fundando assim exigências inatingíveis. Segundo Han, é essa violência da positividade que leva o sujeito atual ao principal mal de nossos tempos: a depressão. A depressão é um ajustamento criador, uma estratégia de sobrevivência, uma forma de resistir frente a exigências positivas inatingíveis. E o sentido político de nossa prática terapêutica será fazer frente a essas exigências.

Vamos parar de fingir que está tudo ótimo?

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