O que é responsabilidade afetiva?

Matheus Ribeiro

Matheus Ribeiro

Assim como sabemos que depois do inverno vem a primavera, também é certo que volta e meia o povo da internet gosta de discutir sobre responsabilidade afetiva. O tema é tão polêmico e envolvente justamente pela natureza complexa e até um pouco paradoxal do conceito. Como poderíamos ser responsáveis por algo que não controlamos? Mais ainda, em que sentido temos algo a ver com o afeto do outro?

Exemplos sempre ajudam. Imagine que você está casado e feliz há 20 anos, em um relacionamento monogâmico. Um dia, conhece uma nova pessoa e se apaixona no maior estilo filme adolescente. Seu cotidiano é consumido por pensamentos e sentimentos de culpa e mesmo pela possibilidade de trair seu parceiro, por quem, após tanto tempo, você nutre profundo companheirismo. O que seria responsabilidade afetiva nesse caso? Calar o sentimento, guardar para si na expectativa de que alguma hora ele passe? Reprimir-se pelo matrimônio? Ou talvez atender ao desejo pulsante em nome de uma vida livre? A responsabilidade afetiva é com o afeto de quem?

Se tem algo que as horas de consultório proporcionam aos terapeutas são ainda mais dúvidas, ou melhor, a certeza absoluta de que afetos não são nada simples. Tal qual filhos rebeldes, eles não se importam com normas, valores ou acordos de bom convívio. Precisamente por isso, Freud acreditava que algum nível de repressão era necessário para a vida em sociedade (tema para ser discutido em outro momento). Aliás, se tem algo que o pai da psicanálise fez muito bem foi mostrar que não somos senhores de nossa própria casa. Se nem nós mesmos conseguimos compreender nossos desejos, como exigir transparência num relacionamento amoroso?

O panorama é o seguinte: somos sujeitos de carne, osso e afetos vagando pelo mundo. Nessas errâncias, ocorre o frequente milagre do encontro, no qual nos iludimos (ou estamos corretos, vai saber!) que o outro pode dar o que nos falta. Nesses encontros nos alegramos, entristecemos, rimos, choramos, nos angustiamos, entre outras mil possíveis experiências. Mas nunca chegamos a eliminar completamente a falta, nunca nos tornamos um todo fechado – por mais que muitos tentem – porque o tempo sempre passa e o mundo sempre bate na porta.

Responsabilidade afetiva, na minha compreensão, não é nada mais do que a admissão dessa incompletude – desse lugar de vulnerabilidade. Ser responsável é estar comprometido eticamente com o fato de que não escolhemos o que sentimos e, ao mesmo tempo, apesar de tudo isso, ainda queremos compartilhar a jornada e o mundo com essas pessoas tão especiais que elegemos como destinatários de nosso amor. E o amor é lindo.

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